Forró Ostentação: O Legado Que Pedrinho Pegação Deixou Para Gerações Como a do Nattanzinho
Naquela época, o forró não era simplesmente um gênero sonoro, nem uma tendência viral passageira. Era quase uma religião entre os jovens. Era sobre quem você era, sobre onde você estava, sobre o que você vestia, sobre qual carro você dirigia e, principalmente, sobre o som que saía da sua caixinha JBL da época , que, cá entre nós, nem JBL era, mas fazia estrago na varanda da casa de praia, na resenha ou no paredão da galera.
Eu, criança naquela época, via tudo isso de longe, com aquele misto de fascinação e frustração. Porque, embora eu curtisse o som , sim, eu era daquelas crianças que tinha um cartão de memória ou um pen drive recheado de "Forró da Pegação, Aviões do Forró, Solteirões do Forró e Garota Safada", o mundo das festas, dos shows, dos camarotes e das Hilux lotadas ainda estava distante dos meus pés de Havaianas.
Enquanto a molecada de hoje acha que ostentar é fazer challenge no Instagram ou abrir caixinha de stories em viagem internacional, naquela época, ostentação tinha outro peso, outra estética, outro código. Ostentar era aparecer no show do Wesley Safadão , que já fazia história ao transformar sua banda Garota Safada numa das maiores carreiras solo da música nordestina , usando aquele look padrão que definia quem era "dos plays":
Sapatênis Pegada em couro;
Boné John John ou boné personalizado com a logo de WS;
Camisa polo Ralph Lauren ou Lacoste;
Óculos Oakley Sylas Polarizado Prizm Sapphire.
E o auge? Era chegar de Mitsubishi Pajero Full, Hilux SW4 ou Range Rover Evoque, abrir a porta com aquele cheiro de couro misturado com pitú, Skol e Cîroc, e entrar no evento como quem sabia exatamente que estava vivendo o auge de uma geração.
O consumo dentro dos shows também dizia muito sobre quem você era. Era Skol, Cerveja Pilsen, e quando queria mostrar mais moral, subia uma torre de Cîroc, Red Label, Slova e aquela Pitú para lembrar que, apesar de playboy, a raiz nordestina ainda pulsava forte.
E no meio desse movimento, é impossível não cravar com todas as letras: Pedrinho Pegação REINVENTOU o forró da playboyzada. Ele fez mais do que cantar. Ele entregou uma narrativa, uma estética, uma pegada que abriu espaço e deu visibilidade a toda uma leva de artistas que hoje surfam nessa onda. Se hoje você escuta Henry Freitas, Thiago Freitas, Lipe Lucena, Núzio Medeiros , Eric Land , Felipe Amorim e acha tudo lindo, precisa entender que eles só estão aqui porque alguém correu muito antes.
Naquele tempo, o sucesso era diferente. Era orgânico, era suado, era no braço, na raça e no gosto popular de verdade. Não existia Spotify, Deezer ou tráfego pago pra empurrar música em feed de ninguém. Era no CD promocional, baixado direto no site Sua Música. Quem viveu sabe o peso de acessar aquele site e procurar: "Forró da Pegação 2014 , CD PROMOCIONAL" e rodar esse som no pen drive, no paredão da casa de praia ou no som do carro.
E não pense que era fácil. Essa galera não fazia música pra algoritmo. Fazia música pra povo. Pra aquele povo que suava, dançava, beijava, se apaixonava e se iludia no embalo das guitarras elétricas, dos metais e da sanfona misturada com batidas eletrônicas.
É aqui que entra a crítica: o que hoje é trend, ontem era resistência. O que hoje é viral, ontem era batalha. A galera acha que a geração Nattan, Henry Freitas, Lipe Lucena, Devinho ou João Gomes está inovando no forró? Tá sim, claro. Mas a inovação só é possível porque teve uma galera antes que transformou o forró tradicional num movimento urbano, estilizado, digital e, principalmente, desejável.
Essa fase, entre 2014, 2015 e 2016, foi literalmente o auge daquilo que eu chamo de "Elite do Forró Ostentação". Era mais que música: era o símbolo da transição cultural de um Nordeste que já não queria ser visto como "atrasado". Que já não se contentava em ser apenas coadjuvante na cena musical brasileira. Eles queriam, e conseguiram, ser protagonistas , na batida do forró moderno, estilizado e com cara de sucesso.
Hoje, olhando pra trás, bate aquele gosto agridoce. De um lado, a alegria de ter visto nascer algo tão autêntico, tão nosso, tão potente. Do outro, aquela nostalgia e uma ponta de frustração, porque, confesso, minha maior vontade era ter sido da playboyzada dessa época. Ter vivido mais de perto os shows, as resenhas, as viagens, os rolês, os paredões, os camarotes, e tudo isso embalado ao som daquilo que, pra mim, nunca foi só música. Sempre foi história.
E que fique registrado: antes de Nattan voar, Pedrinho Pegação e Wesley Safadão precisaram correr. E correram bonito. Correram tanto que abriram caminho pra que o forró se tornasse o que ele é hoje: gigante, popular, digital, global , mas, sobretudo, nordestino.
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