A Beleza Está na Sua Era do Flop E Quase Ninguém Está Percebendo

Parece até piada dizer que a indústria da beleza está em crise. Em um mundo obcecado pela estética, pelos filtros, pela aparência e pela promessa do skincare perfeito, quem poderia imaginar que justamente o mercado que vende autoestima, juventude e perfeição estaria balançando na própria base?

Mas é exatamente isso que está acontecendo. E não é só um tropeço passageiro. É um colapso silencioso, disfarçado por números isolados de sucesso e manchetes maquiadas com dados que parecem promissores, mas escondem uma realidade muito mais dura.

Na mesma semana em que a Rode, marca da Hailey Bieber, foi avaliada em 1 bilhão de dólares, e a Sephora anunciou crescimento de dois dígitos dentro do grupo LVMH , algo raríssimo em 2025 , um dos maiores portais de moda do mundo soltou a bomba:
“A beleza entrou na sua era do flop.”
E por mais contraditório que pareça, eles estão certos.

A crise não é só estética. É econômica, comportamental, cultural e, acima de tudo, estrutural. E ela tem três causas muito claras:

1️⃣ A Desaceleração da Ásia: Quando o Motor Parou de Girar

A Ásia, que por anos foi a locomotiva do mercado global de beleza , especialmente a China , simplesmente freou o consumo. E quando um dos maiores mercados do mundo desacelera, o impacto é catastrófico.

O motivo? Uma mistura explosiva de recessão interna, crise imobiliária chinesa, aumento do desemprego juvenil e uma nova geração muito mais econômica, consciente e menos obcecada pelo consumo desenfreado que marcou a geração anterior.

As marcas ocidentais, que dependiam desse apetite voraz asiático por luxo e cosméticos, começaram a sentir o chão ceder.

2️⃣ K-Beauty: A Revolução Coreana Que Engoliu o Ocidente

Enquanto os gigantes tradicionais como Chanel, Lancôme e Estée Lauder gastavam fortunas mantendo uma estética antiquada, a indústria coreana simplesmente tomou conta do mercado mundial.

O K-Beauty deixou de ser nicho e se tornou mainstream.

Nos Estados Unidos, marcas coreanas não são mais “exóticas”. São, hoje, as favoritas dos millennials e da geração Z, que trocam sem pensar uma máscara da Lancome por um sérum coreano que custa um terço do preço e entrega o triplo do efeito.

A proposta é simples: tecnologia de ponta, embalagens minimalistas, ingredientes naturais, resultados rápidos e preços acessíveis.

E isso tem um nome no mercado: disrupção.

3️⃣ A Era do Dupe: Quando Ser Cópia Virou Desejo

Soma-se à crise a explosão das “dupe brands”, aquelas marcas que não têm vergonha de ser assumidamente cópias mais baratas dos grandes nomes da beleza.

O comportamento do consumidor mudou radicalmente. Ninguém mais se sente mal por comprar o similar , pelo contrário, ostentar um dupe virou até um sinal de inteligência financeira.

Por que pagar R$ 300 num blush de marca se você pode ter um idêntico por R$ 39,90?

Essa mudança é impulsionada por três fatores:

A inflação global, que corrói o poder de compra.

A instabilidade econômica, fruto de guerras, crises políticas e tarifações como as herdadas da era Trump.

E, claro, uma nova consciência coletiva que mistura consumo responsável, estética minimalista e cansaço do luxo ostentatório.


O que antes era desejo, hoje é questionamento.

📉 O Efeito Dominó Nos Conglomerados Globais

L’Oréal, Estée Lauder, Shiseido, ELF, Coty, Douglas.

Todos eles, sem exceção, reportaram resultados abaixo do esperado em 2025.
Todos adotaram a mesma narrativa:

"Ano desafiador. Precisamos de resiliência.”

Curioso, não? O mesmo discurso usado em 2020, na pandemia.

A diferença? Naquela época, a crise foi sanitária. Hoje, é econômica, estrutural e cultural.

🎭 O Marketing Sensorial Como Fuga: Gula, Olfato e Extravagância

Com a queda no desejo pelo produto em si, a indústria buscou uma saída. E ela se chama “overstimulation”.

Começamos a ver comida , ou melhor, indulgência sensorial , nas campanhas.
O batom não é mais só um batom. Ele vira um morango suculento.
O blush não é mais só um blush. É uma torta cremosa, que desperta fome, desejo, gula.

As flores tomam conta dos cenários, dos fundos, dos produtos, porque o olfato , mesmo não presente na tela , é simulado pela memória sensorial.

O resultado? O produto some. Fica em segundo plano.
O que importa é o sentir. Porque comprar por status já não funciona. Comprar por necessidade, menos ainda.

A beleza, portanto, se disfarça de experiência sensorial.
De prazer. De fuga. De dopamina instantânea.

O maximalismo atual, essa estética carregada, saturada, brilhante, com excesso de cor, brilho, textura e cheiro, não é sinônimo de riqueza. É sintoma de colapso.

Quando o mercado não consegue mais vender status, ele vende sensações.
Quando não consegue mais vender necessidade, vende desejo momentâneo.

E, assim, o batom se transforma em uma sobremesa. O skincare vira um ritual sensorial. A maquiagem deixa de ser sobre beleza e passa a ser sobre performar prazer.

A crise não é apenas econômica. É cultural. É uma ruptura com a lógica que sustentou o luxo e a estética por décadas.

O colapso da Ásia, a ascensão do K-Beauty, a explosão dos dupes, a mudança no comportamento do consumidor e a saturação sensorial são sintomas de um mercado que não quer admitir que seu modelo está falido.

E, sim, algumas marcas resistem , como Sephora, Rode e empresas específicas do grupo LVMH , mas o conjunto da indústria vive uma ressaca pesada, disfarçada de maximalismo, dopamina e excesso.

A beleza, enfim, está na sua era do flop.
E só não enxerga quem ainda está olhando para a vitrine e não percebeu que ela já está... vazia.

Trago Fatos , Marília Ms.



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