CBF, poder e os R$ 215 mil: o que está por trás do aumento milionário aos presidentes das federações estaduais
Na contramão do futebol de base precarizado, dos clubes pequenos agonizando em folha, e do torcedor cada vez mais distante dos bastidores do esporte que ama, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) decidiu aumentar os salários dos presidentes das federações estaduais de R$ 50 mil para R$ 215 mil mensais. Isso mesmo: um reajuste de 330% para os homens que comandam entidades muitas vezes inoperantes, com calendários pífios e pouca ou nenhuma contribuição efetiva ao desenvolvimento técnico do futebol.
A justificativa? Nenhuma pública ou ética. O que há, na prática, é um complexo sistema de troca de favores, blindagem institucional e compra de fidelidade eleitoral , e o maior beneficiado, é claro, é Edinaldo Rodrigues, atual presidente da CBF, recém-eleito com 100% dos votos dos 27 presidentes de federações e de todos os clubes das Séries A e B.
O que está acontecendo na CBF não é apenas uma reorganização administrativa , é a perpetuação de um sistema que impede qualquer renovação política e moral dentro do futebol brasileiro.
Um presidente blindado por um colégio eleitoral viciado
Para entender por que a CBF decidiu pagar mais de R$ 2,5 milhões por ano para cada presidente de federação, é preciso olhar para o modelo de votação da entidade. Cada um dos 27 presidentes estaduais tem um voto com peso 3 nas eleições da confederação. Na prática, isso significa que o dirigente de uma federação pequena , cuja atividade se resume a um campeonato de dois meses , tem mais peso na eleição do presidente da CBF do que um clube da Série A.
Ou seja: Edinaldo Rodrigues garantiu sua reeleição com votos de dirigentes que, agora, foram recompensados com um aumento salarial surreal, incompatível com a realidade econômica e social do país , e muito mais ainda com o serviço que prestam.
Essa política de benesses não é nova. Já foi usada em outras gestões, mas o nível atual do reajuste ultrapassa os limites do razoável. É um escárnio diante da miséria das divisões inferiores, da inércia das federações em promover o futebol local, e da ausência total de transparência.
O futebol virou moeda de troca institucional
A reeleição de Edinaldo Rodrigues também teve outro protagonista nos bastidores: Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados. A reunião entre os dois para discutir as eleições da CBF escancara a promiscuidade entre o futebol e a política institucional , mesmo sendo a CBF uma entidade privada, oficialmente autônoma do governo.
O que estaria em jogo? Influência política, capacidade de nomeações, apoio em pautas no Congresso, e o controle de uma máquina bilionária. Vale lembrar que a CBF tem faturamento de mais de R$ 1 bilhão por ano, quase todo vindo de patrocinadores privados e direitos de transmissão , ou seja, é uma máquina de poder e dinheiro sem fiscalização efetiva.
E é nesse contexto que a CBF levou um senador e um deputado federal para a Copa do Catar com tudo pago, incluindo hospedagem de luxo. O objetivo? Fortalecer alianças políticas e construir escudos contra futuras investigações. Afinal, manter Brasília feliz virou questão estratégica para a confederação.
O contrato com o IDP de Gilmar Mendes
Outro elo revelador da teia de interesses da CBF está no contrato com o IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público), fundado por Gilmar Mendes, ministro do STF. O instituto é hoje presidido por Francisco Mendes, seu filho.
A pergunta que ecoa: por que a CBF, entidade privada e esportiva, firmou um contrato com uma instituição voltada ao ensino jurídico? O que está em jogo nesse acordo? Existe assessoria legal? Estudos? Ou é mais uma forma de manter relações amistosas com os poderes da República?
A reportagem da Piauí, assinada por Allan de Abreu, sugere que há mais do que simples prestação de serviços: há articulações de bastidores que tentam blindar juridicamente a gestão da CBF, num país em que a Justiça e o esporte têm uma história de conveniências pouco republicanas.
E o futebol nisso tudo?
Enquanto isso, o torcedor vê estádios vazios, gramados ruins, clubes endividados, e divisões inferiores ignoradas. O futebol de base continua sem investimento. A profissionalização das federações é um mito. Os campeonatos estaduais, salvos por um ou outro clássico, sobrevivem sem atratividade ou inovação.
O futebol feminino ainda luta por visibilidade e apoio, e a Seleção Brasileira masculina , mesmo com toda a estrutura, vive crises de identidade, comando e rendimento.
E no meio disso tudo, a prioridade da CBF foi aumentar salários de cartolas com desempenho quase nulo em suas federações. Um escárnio com nome e sobrenome. E com endereço: sede da CBF na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.
O futebol brasileiro segue sequestrado
Não é exagero dizer que a estrutura da CBF é um presidencialismo absolutista disfarçado de democracia corporativa, sustentado por votos comprados com dinheiro público disfarçado de verba privada.
A farra dos R$ 215 mil por mês é só mais uma face do que acontece quando o futebol é governado como feudo, e não como patrimônio cultural.
Se o futebol brasileiro quer ser respeitado, dentro e fora de campo, ele precisa de reforma estrutural, auditoria independente, fim do colégio eleitoral desigual e transparência absoluta.
Até lá, o que teremos são cartolas enriquecendo, políticos viajando às custas do futebol, e o torcedor pagando o ingresso mais caro do mundo para ver o mesmo jogo sujo fora das quatro linhas.
Trago Fatos , Marília Ms .
Comentários
Postar um comentário