2025: O Ano em que Viramos Tendência



Chegamos em 2025, e mal atravessamos o primeiro semestre. Mas, se alguém acordasse de um coma de anos e resolvesse fazer um giro de cinco minutos pelas redes sociais, sairia com a sensação clara de que o mundo virou um feed de ironia. Nada de reformas estruturais, avanços civilizatórios ou revoluções espirituais. A pauta de todos os dias virou um espelho cômico , e às vezes trágico , de uma sociedade que parece entediada demais para pensar, mas agitada demais para se calar.

Sim, estamos falando de um país onde o assunto mais comentado nas manhãs de segunda é um remix entre Frei Gilson, Mounjaro, café com Deus Pai e ovo a preço de trufa branca. Se o mundo virou meme, o Brasil já está em sua terceira temporada de spin-off.

Frei Gilson, o influencer da fé

Começamos com Frei Gilson, cuja popularidade ultrapassa os muros do convento e invade o TikTok com a força de um popstar gospel. O fenômeno não está apenas na mensagem ,   que muitos fiéis valorizam , mas na forma como ele se tornou o fidget spinner espiritual do brasileiro moderno: o país em que a Bíblia compete com o algoritmo.

O curioso é que a religião não está em crise, mas sim em brand awareness. O cristianismo brasileiro virou marca, virou curso, virou live com QR Code e Pix. Frei Gilson é só o sintoma mais visível de uma geração que quer rezar em 4K e, de preferência, com uma boa trilha sonora e um Reels motivacional logo após o amém.

Mounjaro: emagrecer é mais fácil do que desconstruir gordofobia

Outro protagonista do momento é o Mounjaro, o medicamento para diabetes tipo 2 que virou objeto de desejo nas farmácias de elite por um motivo simples: emagrece. Porque sim, seguimos reféns de uma estética que nos promete aceitação social em troca da nossa saúde mental, do nosso fígado e do nosso bolso.

No país onde ser gordo é quase um crime e ser magro é passaporte para “pertencer”, o Mounjaro virou símbolo de uma sociedade que prefere gastar R$ 2 mil por mês com agulhas semanais do que ir à terapia. A estética venceu de novo. E o mais absurdo? Celebramos isso como avanço, com direito a influencer fitness dizendo que é “pela saúde”.

Café com Deus Pai, e a espiritualidade em cápsulas

A febre do “café com Deus Pai” é o rebranding da fé em tempos de déficit de atenção. Uma tentativa de empacotar a espiritualidade no formato de café coado, bullet journal e estética Tumblr gospel. É a religião Pinterest: bonita, minimalista, superficial.

A busca por sentido se transformou num produto vendável, digerível e rápido. Como se fosse possível encontrar iluminação divina entre um “bom dia com versículo” e um repost no Instagram. O sagrado virou conteúdo. E a fé, um filtro.

Pistache, Kwid e a economia do delírio

É isso mesmo: em 2025, um potinho de sorvete de pistache custa quase o mesmo que um almoço executivo. E o Renault Kwid, um carro que mal tem espaço pra uma mala de viagem, está beirando os R$ 80 mil. A sensação de estar em um episódio distorcido de “Black Mirror” se intensifica quando percebemos que o ovo ficou 600% mais caro e o café 1000%. Isso não é inflação, é crueldade gastronômica.

Mas o brasileiro responde com memes. Porque o país que não tem dinheiro para gasolina está comprando cápsulas de café gourmet e sonhando com pistache, ainda que o salário mínimo continue uma piada de mau gosto. A economia está ruim, mas o marketing está ótimo.

TDAH, CEO de MEI e o culto à produtividade

Outro fenômeno é o crescimento exponencial de pessoas se autoafirmando com TDAH sem diagnóstico , não por maldade, mas porque o cansaço mental virou o padrão da era digital. Ninguém consegue mais ler um livro, prestar atenção num podcast inteiro ou dormir sem precisar de melatonina. Logo, se sentir ansioso, desorganizado e sobrecarregado virou uma espécie de autoafirmação.

E aí entra o “CEO de MEI”. Um país de microempreendedores que vendem cursos de como vender cursos para outros microempreendedores que também querem vender cursos. É o capitalismo do coaching em sua forma mais crua: você não precisa ser bom, só parecer ser. E se for bom de discurso, pode até fundar um ministério.

Curso de marido, Tadalafila em goma e masculinidade de conveniência

Talvez o ponto mais bizarro (ou cômico) seja o sucesso do curso “Legendários”, voltado a ensinar homens a serem bons maridos , como se ética e empatia fossem conteúdo de apostila e não princípios básicos de convivência.

Como se não bastasse, o combo da masculinidade frágil é completado com Tadalafila em goma de mascar, prometendo ereções espontâneas ao som de louvor. Sim, vivemos num tempo em que até a virilidade virou produto e a performance no casamento virou coaching com certificado.

“Viver é diferente de tá vivo”

A frase é um bordão clichê do cantor Natanzinho Lima e de todas as frases que circulam nas redes sociais, essa talvez seja a mais honesta. Porque estamos todos sobrevivendo a uma avalanche de estímulos, mentiras estéticas, hiperconsumo e existências vendidas por parcelas no cartão.

Viver é diferente de tá vivo” é o lamento silencioso de uma geração que acorda, faz café, lê um versículo, injeta Mounjaro, posta reels sobre ansiedade, toma café de R$ 10, compartilha uma frase de Frei Gilson, e no final do dia se pergunta: “pra quê tudo isso?”

2025 começou como uma piada pronta. Estamos distraídos, polarizados e dopados de informações inúteis. Mas no fundo, a pauta de todos esses absurdos aponta para um mesmo buraco: estamos tentando preencher o vazio com qualquer coisa que prometa sentido.

Frei Gilson, o café com Deus, o pistache gourmet, o TDAH sem laudo, o curso de coach marido: tudo isso é só o grito abafado de uma sociedade que não sabe mais o que é estar presente, o que é amar sem expectativa, o que é viver de verdade. Talvez o problema não seja o Brasil estar esquisito. Talvez o problema seja a gente.

E o mais doido? Ainda estamos só em Maio.

Trago Fatos, Marília Ms.

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