137 Anos da Lei Áurea: Uma Liberdade Incompleta e Sem Reparações
137 Anos da Lei Áurea: Uma Liberdade Incompleta e Sem Reparações
Em 13 de maio de 1888, a princesa Isabel assinava a Lei Áurea, o ato formal que proclamava o fim da escravidão no Brasil. Com dois artigos, a lei foi breve e direta: o primeiro declarava extinta a escravidão e o segundo revogava as disposições contrárias. No entanto, essa “liberação” não trouxe consigo a verdadeira liberdade nem a reparação para milhões de afrodescendentes que viveram mais de três séculos sob condições subumanas. A escravidão não acabou com a assinatura de uma princesa. Ela foi enfraquecida pela luta incessante de milhares de pessoas negras, tanto dentro quanto fora dos senzais, em uma resistência que moldou o próprio movimento abolicionista brasileiro.
A Abolição: Uma Farsa de Liberdade
É importante destacar que, em 1888, mais de 90% da população negra já estava livre, não por conta de uma decisão nobre da monarquia, mas pelo trabalho árduo de resistência e pela pressão crescente dos quilombos, revoltas e movimentos abolicionistas liderados por negros. O Quilombo dos Palmares, sob a liderança de Zumbi e Dandara, é um dos maiores exemplos dessa resistência, pois foi a partir de sua luta que o sistema escravocrata viu suas bases estremecerem.
No entanto, a Lei Áurea não foi a libertação de fato. Ela foi uma medida política que respondeu a uma crise econômica interna, em especial no setor agrícola, que dependia cada vez menos da mão de obra escrava devido à mudança das relações de produção e à crescente pressão internacional por uma economia mais "moderna". A abolição formal aconteceu num momento em que o próprio sistema da escravidão estava ruindo, não como uma concessão da monarquia, mas como um reflexo da resistência e da rebelião de negros e negras que haviam conquistado, por suas próprias mãos, a maior parte de sua liberdade.
A Ausência de Políticas de Inclusão: O Fardo da Liberdade Sem Direitos
O que se seguiu à assinatura da Lei Áurea foi um vazio social e econômico para os negros libertos. A abolição não trouxe, como era esperado, políticas públicas de inclusão para os ex-escravizados. Não houve acesso à terra, educação, moradia ou emprego. Ao contrário, uma série de leis racistas foram estabelecidas para garantir a exclusão dos negros da sociedade. A Lei da Vadiagem, por exemplo, criminalizava os negros que não tinham ocupação registrada e, na prática, se tornou uma ferramenta para prender e perseguir aqueles que, após serem libertos, não conseguiam se inserir no mercado de trabalho.
A falta de terras para os negros foi outro golpe brutal. Muitos ex-escravizados, sem opção de trabalho e sem condições de sustento, foram forçados a viver em condições precárias, em comunidades marginalizadas que perduram até hoje. Essas comunidades, muitas vezes, acabaram se tornando focos de pobreza, violência e exclusão social, reforçando um ciclo de miséria que se perpetua por gerações.
A Perpetuação do Racismo e da Exclusão Social
A abolição formal da escravidão não significou a abolição do racismo. O sistema de exclusão racial e social estava tão arraigado na estrutura da sociedade brasileira que, mesmo após a abolição, a população negra continuou a ser tratada como cidadã de segunda classe. Negros e negras foram empurrados para a marginalidade, sem acesso a direitos básicos, sendo frequentemente criminalizados e encarcerados.
O governo e a classe dominante criaram um novo tipo de sistema de opressão, mas agora mais sutil e camuflado, baseado no preconceito, na discriminação e na violência cotidiana. Leis como a Lei da Vadiagem e outras medidas autoritárias ajudaram a garantir que a população negra fosse excluída do mercado de trabalho, da educação e do acesso à terra.
No Brasil de hoje, mais de um século após a abolição, a população negra continua sendo refém das consequências dessa falha histórica. A pobreza, a falta de educação, os empregos precários e a violência policial são ainda os maiores desafios enfrentados pelos negros e negras no Brasil. Além disso, o genocídio da população negra nas periferias das grandes cidades continua a ser um dos maiores problemas do país, uma consequência direta da falta de políticas públicas efetivas para reparar os danos causados pela escravidão.
A Farsa da Abolição Sem Reparações
O Brasil nunca fez a devida reparação aos negros e negras pela exploração brutal que sofreu durante os quatro séculos de escravidão. O país não criou políticas públicas de inclusão ou de reparação, como aconteceu em outros países que aboliram a escravidão. Pelo contrário, a exclusão da população negra foi consolidada através de um sistema de políticas públicas que favoreciam a branquitude e negavam os direitos fundamentais aos negros.
A luta pela verdadeira liberdade e igualdade continua. Não se pode mais tratar a abolição da escravatura como uma vitória final. O sistema que oprimiu milhões de pessoas negras não desapareceu com a assinatura de um decreto. Ele se transformou, mas ainda está presente nas estruturas sociais, econômicas e políticas que perpetuam a segregação e a desigualdade racial.
Construindo a Luta para Superar o Racismo Estrutural
É preciso retomar os debates sobre a importância da reparação histórica, através de políticas que garantam acesso à terra, educação, emprego e saúde para a população negra, além de uma reforma profunda no sistema de justiça que, até hoje, criminaliza e margina os negros. A ação direta e independente dos movimentos negros e das organizações sociais e políticas da classe trabalhadora são fundamentais para derrotar o racismo estrutural e garantir os direitos de todos os brasileiros, independentemente de sua cor.
A luta dos negros e negras no Brasil não acabou com a abolição formal da escravatura. Ela continua no enfrentamento diário contra o racismo e a desigualdade, e será somente através dessa luta incansável que o Brasil poderá, um dia, alcançar a verdadeira liberdade para todos. A construção de uma sociedade sem segregação racial só será possível com a tomada do poder e a construção de uma sociedade socialista, onde o racismo e todas as formas de opressão sejam finalmente abolidos.
Trago Fatos , Marília Ms.
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