Sergipe amarga o último lugar em arborização urbana: quando o concreto vence a sombra das árvores
Não é só uma impressão popular. Não é só um calor abafado no peito e nos ombros quando se caminha pelas ruas de Aracaju ao meio-dia. É estatística. É ranking. É realidade documentada pelo Censo do IBGE: Sergipe é o estado com menor índice de arborização urbana do Brasil. Apenas 38,6% dos sergipanos vivem em ruas com árvores, enquanto a média nacional é de 66,56%. Em contrapartida, estados como Mato Grosso do Sul ostentam mais de 90% de arborização. No Nordeste, somos a lanterna, enquanto o Ceará, o Piauí e o Rio Grande do Norte aparecem no topo da lista regional.
Aracaju, que já foi exemplo de cidade planejada, amarga agora a 23ª posição entre as 27 capitais. Só 44,3% da população aracajuana vive em ruas com algum tipo de vegetação. E os dados refletem o que a população sente no corpo e observa no concreto: cidades cada vez mais quentes, secas, alagadas e sem refúgio do sol.
A zona sul da capital perdeu mais de 200 árvores na Avenida Hermes Fontes. O verde foi substituído por faixas de rolamento, como se o carro fosse mais digno de sombra do que a criança, o idoso, o trabalhador que espera o ônibus. Na zona norte, na Avenida Visconde de Maracaju, a promessa era de um canteiro arborizado. O que se entregou, no entanto, foi mais uma pista nua de cimento , onde a expectativa virou decepção e onde o asfalto queimando virou rotina.
Se o poder público é parte do problema, lamentavelmente ainda não é parte da solução. Não há políticas robustas de incentivo à arborização urbana. A distribuição de mudas é escassa, desorganizada e raramente acompanhada por campanhas educativas. O incentivo à população plantar e cuidar de uma árvore na calçada é quase inexistente. O que deveria ser uma prioridade virou descaso. Falta visão de futuro, falta sensibilidade, falta gestão.
E não se trata apenas da capital. O problema é estadual. De norte a sul de Sergipe, a ausência de árvores nas vias públicas torna nossas cidades menos habitáveis, menos bonitas, menos humanas. E isso tem consequências diretas: altas temperaturas cada vez mais insuportáveis, ilhas de calor urbano, aumento no consumo de energia elétrica, riscos à saúde pública e, quando chove, o desequilíbrio se expressa nos alagamentos que paralisam bairros inteiros.
A crise climática é global, mas se materializa localmente com a omissão dos gestores públicos. Não há como dissociar o desmatamento urbano da piora das condições de vida nas cidades sergipanas. Árvores não são luxo. São infraestrutura essencial. São barreiras contra o calor, são abrigo da fauna urbana, são filtros naturais contra poluentes e agentes nocivos à saúde. Sem elas, nosso cotidiano se torna mais duro, mais seco, mais doente.
É preciso agir com urgência. Reverter esse quadro exige compromisso coletivo, sim, mas principalmente uma ação imediata dos governos municipais e estadual. Precisamos de planos municipais de arborização urbana, metas claras, plantios orientados por especialistas, escolha de espécies nativas, participação das comunidades e fiscalização da derrubada criminosa de árvores em nome do progresso que só favorece a especulação imobiliária e o transporte motorizado.
Sergipe não merece esse título vergonhoso. Aracaju não pode ser lembrada como uma capital onde o sol castiga sem piedade por falta de árvore. Nossas cidades precisam voltar a oferecer sombra , e não apenas no discurso. Precisam ser lugares onde se respira melhor, onde o verde é parte da paisagem, onde o direito ao bem viver seja respeitado, inclusive com raízes e copas espalhadas pelas calçadas.
É tempo de plantar futuro. Porque sem árvore, não há cidade. Sem sombra, não há descanso. Sem verde, não há vida digna nem para os que andam nem para os que sonham.
Trago fatos, Marília Ms.
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