Por que tantos estabelecimentos estão fechando em Sergipe?
Nas últimas semanas, Sergipe tem testemunhado o que parece ser uma epidemia silenciosa: o fechamento de estabelecimentos que, por anos, fizeram parte do cotidiano da população, movimentaram a economia e deram identidade à vida urbana. São portas se fechando , algumas sem alarde, outras com despedidas emocionadas , como no caso do Supermercado Mássimo, que anunciou encerramento para o fim de maio; a Casa Aho, referência em café, arte e gastronomia afetiva, que encerrou suas atividades; e a Churrascada Salt, outro nome de peso que se despede do mercado.
Mas esses são apenas os rostos mais visíveis de um colapso mais profundo. Por trás deles, há uma série de outros empreendimentos que não aguentaram: lojas de bairro, pequenos mercados, salões de beleza, bares, cafeterias, startups, brechós, empresas familiares. Negócios que foram abertos com coragem, esforço e esperança, mas que não encontraram o terreno fértil necessário para crescer, se sustentar e sobreviver.
A pergunta que não quer calar é: por que tantos negócios estão fechando em Sergipe? O que está nos sufocando?
A resposta é complexa, mas podemos começar por uma palavra-chave: descompasso.
Vivemos um descompasso violento entre o custo de empreender e o retorno financeiro que esse empreendimento gera. A carga tributária no Brasil já é uma sentença de morte para o pequeno empresário. Em Sergipe, essa realidade é ainda mais cruel. Aluguéis inflacionados, energia elétrica altíssima, fornecedores com preços em constante alta, impostos que não perdoam atrasos, e, muitas vezes, a ausência de qualquer suporte prático do poder público para quem resolve abrir um negócio na coragem.
Empreender aqui é, antes de tudo, um ato de resistência , e resistência cansa.
Enquanto isso, a renda do consumidor sergipano não cresce na mesma proporção. O salário mínimo já não cobre sequer as despesas básicas do mês. A classe média está endividada. A classe baixa está sobrevivendo. E o que sobra , se sobra , é pouco para investir em lazer, gastronomia, consumo local. Soma-se a isso a mudança de hábitos de consumo: a preferência por aplicativos de entrega com taxas agressivas, marketplaces internacionais que oferecem preços baixos e prazos rápidos, mesmo que à custa da precarização do trabalho, da evasão fiscal e da morte do comércio local.
Mas o problema não é só econômico. Ele é também cultural.
O sergipano ainda precisa se reconectar com o que é seu. Ainda há uma tendência a valorizar o que vem de fora: o hambúrguer da rede nacional, o doce da confeitaria paulista, a roupa da influenciadora carioca. Quantas vezes você já ouviu alguém dizer que “aqui em Aracaju não tem nada de bom”? Essa mentalidade é destrutiva. Enquanto repetirmos isso, deixaremos de olhar com afeto e apoio para os talentos locais, para os espaços que oferecem qualidade, criatividade e identidade.
Ser pequeno em Sergipe, muitas vezes, é sinônimo de ser invisível. E ser invisível, cedo ou tarde, leva ao desaparecimento.
Além disso, há um descompasso profundo entre o esforço do empreendedor e o reconhecimento que ele recebe. Muitos investem suas economias, seu tempo, sua saúde mental, suas famílias. Trabalham sábados, domingos, feriados. Dormem pouco, estudam muito, apostam tudo. E mesmo assim, são tratados como “caros”, “inviáveis”, “desorganizados”, ou simplesmente esquecidos. Falta empatia, falta incentivo, falta suporte técnico, falta política pública que realmente chegue na ponta.
E o que fazem os governos?
Na maior parte do tempo, assistem de camarote. Investem em shows milionários para mascarar a crise , a clássica política do pão e circo. Criam editais que não chegam a quem precisa. Fazem propaganda com uma meia dúzia de negócios “modelo” enquanto a base da pirâmide desmorona. Há um abismo entre a realidade dos empreendedores e o discurso institucional.
Onde estão as políticas de incentivo ao pequeno comerciante? Onde está o fomento ao empreendedorismo jovem, negro, feminino, periférico? Onde estão os programas de educação financeira, de inovação tecnológica, de fortalecimento da economia criativa? Onde está o Estado quando o empreendedor está prestes a falir?
É por isso que este texto não é só um lamento. Ele é, sobretudo, um grito de alerta.
Estamos assistindo à falência não só de comércios, mas de uma lógica de cidade que deveria favorecer o que é próximo, o que é plural, o que é nosso. Se continuarmos ignorando essa realidade, perderemos mais do que restaurantes e lojas , perderemos memória, diversidade, empregos, sonhos, oportunidades, e um pedaço importante da nossa identidade.
Por isso, queremos abrir esse espaço para ouvir.
Sem ataques, sem polarizações, sem simplificações baratas. Só escuta, reflexão e construção.
Queremos ouvir quem empreende, quem consome, quem observa. Queremos saber o que você pensa, o que você sente, o que você vive. E, principalmente, como podemos , juntos ,pensar em soluções reais para fortalecer o comércio local, valorizar a cultura sergipana, e criar uma rede de apoio concreta para que nenhum outro sonho precise virar saudade.
Porque o comércio local não é só uma loja. É vida. É coragem. É a alma de uma cidade.
Trago fatos , Marília Ms.
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