Neymar, traição e validação masculina: por que isso sempre vaza?
Os escândalos de traição de Neymar parecem seguir um padrão peculiar: acontecem, vazam rapidamente e geram uma avalanche de comentários nas redes sociais. Mas se pararmos para pensar, quantos outros homens famosos, com o mesmo nível de dinheiro e influência, traem sem que saibamos? Por que Neymar, que tem recursos para manter sua vida privada em sigilo, tem seus casos expostos com tanta frequência?
A resposta não está apenas na curiosidade da mídia ou no desejo de fofoca do público. O que está em jogo aqui é algo maior: a própria construção da masculinidade e o papel que Neymar desempenha como um ícone desse modelo.
O filósofo francês Pierre Bourdieu e a teórica feminista Elisabeth Badinter já explicaram que masculinidade não é algo natural, mas sim um processo construído socialmente. Badinter, em particular, defende que a masculinidade é formada de duas maneiras principais:
-
De forma negativa : Ela se estrutura pela negação de tudo que é considerado feminino. Isso significa que um homem, para ser reconhecido como tal, precisa se distanciar de qualquer traço que possa remeter ao universo das mulheres, como a sensibilidade, a vulnerabilidade e até mesmo a fidelidade (visto que ser “preso” a uma única mulher pode ser visto como fraqueza).
-
De forma imperativa : Os homens crescem ouvindo comandos sobre como devem ser. “Seja homem”, “não chore”, “pegue várias” são ordens e exigências que reforçam um ideal de masculinidade baseado no domínio, na competitividade e no sexo como símbolo de status.
Nesse contexto, a traição de Neymar não é um problema para sua imagem masculina , pelo contrário, ela a reforça. A sociedade molda os homens para enxergarem a sexualidade como um território de conquista e validação entre outros homens. O sexo, para muitos, não é apenas um ato íntimo, mas uma prova de status, um troféu exibido publicamente.
Se a masculinidade se constrói pela negação do feminino, então nada melhor do que reduzir as mulheres a objetos sexuais para reforçar esse distanciamento. A objetificação é a forma mais evidente de misoginia que encontramos no Brasil e no mundo. E é por isso que os escândalos de traição de Neymar ganham tanto espaço: porque reforçam essa narrativa de que ele é um “macho alfa”, um dominador sexual.
Homens como Neymar não traem escondidos porque, no fundo, essas traições não são apenas sobre desejo, mas sobre performance. Não se trata de um impulso incontrolável, mas de um ritual que reafirma sua posição diante de outros homens. No futebol, na cultura do boleiro e na sociedade como um todo, o sexo casual e a traição são vistos como parte desse universo de masculinidade exacerbada.
Aqui entra outro ponto essencial: Neymar não precisa da validação das mulheres. O que importa para ele e para muitos homens como ele é a aprovação de outros homens. É por isso que a exposição das traições não o prejudica , pelo contrário, apenas fortalece sua imagem como um ícone masculino.
Desde cedo, os homens são ensinados a medir seu valor com base na quantidade de mulheres que conquistam. Pais que levam filhos adolescentes para prostíbulos, amigos que parabenizam uns aos outros por ficarem com várias mulheres na balada, celebridades que fazem piada sobre traição como se fosse algo inofensivo , tudo isso reforça a ideia de que a masculinidade se mede pelo sucesso sexual.
O que vemos no caso de Neymar é um ciclo constante: ele trai, a mídia expõe, as redes sociais comentam, as mulheres criticam, mas, no fim, o público masculino o admira ainda mais. O escândalo, em vez de destruir sua reputação, reforça seu status dentro da lógica da masculinidade tradicional.
Agora, imagine se fosse uma mulher famosa na posição de Neymar. O escândalo teria um desdobramento completamente diferente. Uma mulher que trai publicamente não recebe aprovação , ela é atacada, ridicularizada e chamada de promíscua.
Enquanto a traição de Neymar é vista como algo “esperado” ou até “engraçado”, uma mulher na mesma situação seria alvo de um linchamento moral. Isso ocorre porque a sociedade ainda impõe às mulheres a ideia de pureza, fidelidade e submissão, enquanto os homens têm a liberdade de explorar sua sexualidade sem as mesmas consequências.
O caso de Neymar não é sobre um homem infiel qualquer, mas sobre a forma como nossa sociedade constrói e valida a masculinidade. As traições vazam porque fazem parte do jogo, porque alimentam uma narrativa que reforça sua posição dentro da cultura masculina dominante.
O verdadeiro escândalo não é que Neymar trai , isso, infelizmente, é comum entre muitos homens. O problema é que a traição, ao invés de puni-lo, o fortalece. Ele não precisa esconder nada porque, no fim das contas, ser infiel não mancha sua imagem ,apenas confirma seu lugar como um ícone masculino dentro de um sistema que transforma a sexualidade em um campo de validação entre homens.
E enquanto essa estrutura permanecer intacta, escândalos como esses continuarão surgindo, sendo consumidos, debatidos e esquecidos, apenas para se repetirem novamente.
Trago Fatos, Marília Ms.
Comentários
Postar um comentário